"Fardos..."

"Cada qual arrasta seu fardo,
e cada fardo tem seu peso
cada peso é um sacrifício
e o sacrifício nos dá sentido.
O peso aumenta quando subimos
e é dolorido enquanto descemos,
quando dele nos desgarramos
ficamos como cegos perdidos.
O sentido que todos avistam
não é o mais doce, nem mesmo amargo
é insípido, insoso.
Mas de sabor inconfundível.
Vamos mascando o fardo,
enfadados como quem alucina
morte,desejo, sina
Que toquem então o cortejo.
Se querem me ver ao centro
deitado enquanto choram
riam-se de suas tolices
que tão cedo não me entrego."

"Desculpas, somente desculpas...."

"Eu já sonhei que voava
já sonhei que morria
sonhei que amava
sonhei que perdia.
Já corri atrás do vento
já esmurrei o meu corpo
já pensei que alcançaria
os sonhos e promessas.
Crescendo ganha-se muito,
porém o que se perde é dobro
Somem todas as desculpas
que antes você daria.
Somos a soma de um todo,
um pouco do que se é, é o que querem que seja
outro pouco é o que pensam que somos
existe uma parte que é o que pensamos
e uma bem pequena que é o que gostariamos de ser."

"Saudades..."

"Quanto tempo passou
desde a última vez
em que você existiu?
O que está passando agora ?
O que tem sonhado?
Cadê seus amigos?
Onde estão suas horas,
sua matemática,
sua lógica?
Onde cabem minhas perguntas
idiotas?
É como se eu gritasse ao vento
até que suma minha voz.
Pois nenhuma palavra que eu conheça
tem o poder de te encontrar"

"Dane-se..."

"Plantei sementes em solo fértil,
fui displicente,
não consultei o senhor do tempo.
Não comprei aquela terra
ela não era minha
e mesmo assim semeei.
A chuva não seguiu seu fluxo,
mas a semente não quis esperar
e brotou, quebrou a suave casca.
Dane-se tudo!- eu pensei, mas era tarde.
O dono da terra não queria
que a planta frutificasse ali e antes que
ela apontasse eu tive que arrancá-la do seu lugar.
Espero que um dia eu me perdoe
que o senhor do tempo também
por ter sido tão imprudente
com tão preciosa semente"

"idéias..."

"Espalhei idéias no chão,
pra que todos andassem sobre elas
e tivessem descanso.
As idéias eram neve
e não duravam tempo suficiente
para que alguém delas pudesse
tirar proveito qualquer.
Pareciam tão boas quanto estavam em mim
e agoram estão todas misturadas
criaram vida própria,
querem outros donos
outras idéias para se multiplicarem.
As idéias eram leves,
e viajavam com o vento,
eram também impulsos
e ressucitavam os mortosapáticos.
Eram como qualquer outro ser sem corpo
procuravam sempre mentes onde habitar,
mas hoje , são maltrapilhas
errantes, sem lar"

"Desejo..."

"A sede que me consome
não é de água
não é de álcool
é por veneno.
Algo que entorpeça,
mas não minha mente.
Que não me embote os sentidos,
mas me estremeça.
Que seja agudo e cortante,
pontiagudo,,,,, que me incomode.
A sede que me consome é fome;
de despertar mais cedo
de madrugar meu corpo
de não sentir-me morto
nem mesmo morno
tampouco bobo.
A Sede que me consome cede,
mas não o fogo."

"Verdades e mentiras...

"Eu menti...
...e saber que todos mentem não
faz menor minha mentira.
Menti quando disse que acreditava,
nas verdades que contaram.
Mas que mal há?
Se as mentiras as vezes sustentam mais
que todas as verdades amontoadas.
Para que servem as verdades enfim?
Quem quer ouvir as verdades?
Dizem todos que a querem
mas o que na verdade querem
são as suas mentiras, quem pensam serem reais.
Vivem a tanto tempo assim,
que perderam rumo.
Perdi o rumo.
A mentira alimenta,
a verdade embebeda
as duas juntas sustentam vidas
sustentam história.
Quero crer, não nas minhas mentiras
quero encontrar a verdade
não a verdade que buscava Pilatos
mas a verdade que estava ali
sangrando em sua frente"

"Inanição...

"Se não trabalho não como
e o trabalho? Como me devora.
O quanto custa os meus sapatos?
Quanto conforto meus pés precisam?
Se o sal é o mais caro e o alimento assim tão raro,
quanta gente morrerá no caminho
para que eu encha o meu prato?
Vou colher, ainda que não plante,
tudo o que eu achar necessário,
quero emprego, descanso e salário,
quero fazer minha parte,
não quero apenas herdade.
Deglutirei mil palavras,
mastigando-as com vontade,
para cuspir na cara dos fracos,
os dissabores e o amargo
da impotência que exalo."

"Não mais eu..."

"Não preciso pensar da forma que querem que eu pense,
pois quando acredito em suas mentiras
deixo de ser quem sou.
Não preciso das suas pílulas ou de sua cura,
não preciso da sua psicologia.
Enfim não somos todos animais?
Quanto mais me convencem do que preciso ter
quando aceito o que dizem que eu preciso ser
não sou mais eu.
Meus pensamentos ficam tão embaralhados
com esta confusão de palavras
que chegam a sangrar.
O sono não me encontrou deitado,
em minha cama de pedra,
continuo convencido de que não preciso de tudo isto
que dizem que eu preciso ter,
cercado por minhas posses
busco compreender
o que há em mim.
Se o menos é mais,
como posso sustentar estes sonhos que impuseram a mim."

"Repetições...

"Não vou falar sobre caminhos,
nem sobre escuridão ou difíceis decisões
vou falar sobre o que para todos é simples,
ser aquilo que não se é realmente,
viver ilusões sem gosto
enjoar dos sabores
não vibrar com toques
não sentir prazer
Viver por viver,
contando as horas
mesmo que não importe o tempo que passa
pois não te traz nada novo.
Passa um ano, outro vem
e às vezes um sopro
como se fosse começar algo novo,
até que passe e nos lembre
que é tudo sempre igual
a mesma covardia
os mesmos medos
não queria dizer o mesmo caminho, a mesma decisão, a mesma escuridão.
Acabo sempre por me repetir!"

"Daniel e seu leões..."

"...e cada passo que eu dou
ilumina o próximo pedaço do caminho
se olhar o horizonte verei apenas escuridão,
olho então para os meus pés.
Tantas vezes falta coragem para estender a perna
sem saber onde vou pisar, mas é inevitável
só assim vou saber o existe
o que me espera no fim."

"Letra e melodia..."

"Vou deixar que a canção me invada,
letra e melodia
fluindo em meu corpo,
preenchendo cada espaço
o vazio para o qual não encontro palavras.
Vou deixar que canção me mate,
ritimo e título
vibrando minha alma
ressucitando-me outra vez
do sono que ela mesma causou.
Vou lembrar cada nota
depois que a canção terminar,
não vai sair de mim
e ao primeiro acorde
trará tudo a minha mente outra vez
e será como aquele momento
aquela primeira vez."

"...Donos

"Queremos tanto ter o que possuímos
e quando temos ficamos tristes,
pois o que temos nos possui e nos tira a paz.
Gastamos o tempo
a mente
o corpo
e temos tudo
o que podemos comprar,
mas então percebemos,
que lutamos para ter o que agora nos domina.
Escravos, vassalos, servos,
do conforto que custa o alívo
que nossa alma buscava ter.
O simples aqui tão perto,
o pouco em nossas mãos,
enchemos os nossos braços,
do que não precisamos ter
e o que temos nos domina, até não sermos mais
donos de nada, nem mesmo de nós"

"Finito...

"Quando o fim chega
agarramo-nos as bordas
arrancando o barro
cravamos nossas unhas
afundamos nossos dedos
enquanto sentimos o lodo nos engolindo.
Surgem milhares de palavras
mas não são as nossas,
são vozes de todos os lados
centenas de conselhos
verdades absolutas
verdades absurdas
que não são as nossas verdades
são verdades inventadas por quem não passou
por tudo aquilo que passamos.
Quando inevitavelmente termina
sabemos
não aceitamos
nem queremos saber,
buscamos nos sustentar com vento
e sentimos nada debaixo de nossos pés.
Gritar , nem tentamos
sabemos ser inútil
mas não conseguimos deixar ir
desistir, não cabe,
Ficamos em esperanças remotas
Ficamos sem esperança alguma
Ficamos pois não temos para onde ir...
e então não vamos
pois já estamos no fim."